Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso do Sul - Comarca de Campo Grande
autos de no 0116193-47.2007.8.12.0001. 7a Vara Cível de os Competência Residual
Luiz Carlos de Oliveira Santos, brasileiro, portador da cédula de
identificação n.o 020.307 SSP/MS e inscrito no CPF/MF sob o n.o 237.236.451-00,
residente e domiciliado na Rua Treze de Maio, n.o 3921, centro, nesta capital, ajuizou
a presente Ação de Rescisão Contratual c.c Indenização por Danos Materiais e
Morais em face de HDSP Motorcycles Comercial Ltda., pessoa jurídica de direito
privado, inscrita no CNPJ sob o n.o 04.072.8870/0011-07, com estabelecimento na
Avenida Antártica, n.o 62, Barra Funda, na cidade de São Paulo/SP, relatando, em
apertada síntese, que em 23/05/2005 adquiriu da ré uma motocicleta zero quilômetro
da marca Trrimph, modelo T1 Tiger 955i, ano de fabricação 2004, com garantia de 02
(dois) anos, pelo valor de R$ 54.400,00 (cinquenta e quatro mil quatrocentos reais),
cujo pagamento se deu por meio de uma entrada à vista e o restante através de
financiamento. Arguiu que logo após a compra do veículo, este, além de apresentar
elevado consumo de combustível, liberava constante fumaça de seu motor. No dia
18/11/2005, por ocasião da revisão dos 10.000 (dez mil) quilômetros, se dirigiu a
cidade de São Paulo e informou o ocorrido, gerando a ordem de serviços n.o 993/C1.
Alegou que a ré devolveu a moto em 07/12/2005, após realizar um remapeamento da
injeção eletrônica. Argumentou, contudo, que no dia 01/01/2006 o veículo novamente
apresentou defeito, sendo que no dia seguinte, ao se direcionar à concessionária ré,
ficou constatado que o motor encontrava-se fundido. Disse que a ré, após a
substituição de algumas peças, devolveu o veículo em 20/02/2006, não dando
maiores explicações acerca do problema encontrado. Afirmou que em 23/10/2006,
considerando que os defeitos não cessaram, retornou à sede da ré na cidade de São
Paulo, ocasião em que a moto ficou recolhida por mais 15 (quinze) dias, visando
solucionar os problemas encontrados. Entretanto, registrou que, não obstante as
diversas tentativas, até o presente momento os problemas não foram solucionados.
Discorreu sobre ter sofrido danos de ordem material, consistentes em despesas de
hospedagem, combustível e alimentação, em decorrência das inúmeras viagens que
realizou até a cidade de São Paulo, além do transporte com guincho do bem e a
desvalorização do veículo em decorrência dos consertos efetivados. Narrou ainda
sobre os danos morais suportados ante a conduta da ré, estimados em 200
(duzentos) salários mínimos. Ao final, pugnou pela procedência do pedido para o fim
de rescindir o contrato celebrado, restituindo as partes ao estado anterior, além de
condenar a ré ao pagamento de danos materiais no valor de R$ 1.392,01 (um mil
trezentos e noventa e dois reais e um centavo), mais R$ 76.000,00 (setenta e seis mil
reais), a título de danos morais. Protestou pela produção de provas, atribuiu valor à
causa e juntou documentos (f. 02/42).
Regularmente citada, a ré ofereceu contestação às f. 47/78. Em
preliminar aduziu a inépcia da inicial por ausência de causa de pedir, nos termos da
legislação vigente. Concernente ao mérito, arguiu que o autor compareceu diversas
vezes em seu estabelecimento, ocasião das revisões programadas quanto para serviços
de diversas ordens. Anotou que todas as reclamações efetuadas pelo
autor foram solucionadas por ela e que o veículo adquirido está sujeito a apresentar
defeitos. Argumentou que a motocicleta ficou recolhida na oficina por mais de 45
(quarenta e cinco) dias por desídia do autor em retirá-la. Além do mais, apontou que
não houve a fundição do motor da motocicleta, como alegado pelo autor, e que foi
realizado serviço de retifica do motor, consistente em recondicionar e alargar alguns
componentes internos do motor para adequá-los a novos componentes móveis
disponibilizados em medidas suplementares. No mais, asseverou que o diagnóstico
dos problemas indicou um número pequeno de danos, o qual não justificaria a troca
do motor por completo. Afirmou ainda inexistir danos de ordem material, porque o
autor, ao comprar sua moto em outra localidade que não a sua residência, assentiu
conscientemente que a eventual manutenção e reparação de defeitos teria que ser
realizada em outra cidade. Igualmente alegou não subsistir danos morais no caso em
comento, eis que sempre cumpriu seu dever ao providenciar as revisões e as
reparações solicitadas, sendo que a motocicleta adquirida sequer teve seu motor
fundido. Ao fim, pugnou pelo acolhimento da preliminar aventada e, caso esta reste
ultrapassada, a improcedência dos pedidos iniciais, com o afastamento da rescisão
contratual, da restituição dos valores pagos, da indenização por danos materiais e
morais. Pretendeu ainda a condenação do autor ao pagamento das despesas do
processo e dos honorários advocatícios, bem como requereu a produção de provas.
Com a contestação vieram os documentos de f. 79/91. Impugnação às f. 94/102.
Intimados a especificarem provas, a ré pugnou pelo depoimento
pessoal do autor, pela oitiva de testemunhas e pela produção de perícia técnica
específica (f. 105/106) e o autor somente pela ouvida de testemunhas (f. 111).
A audiência preliminar restou infrutífera (f. 114).
Pela decisão de f. 138/139, rejeitou-se a preliminar de inépcia da
inicial alegada em contestação e saneou-se o feito, designando-se a produção de
prova pericial e invertendo-se o ônus da prova, nos termos do código de defesa do
consumidor.
Quesitos da ré às f. 143/145.
Depósito efetivado pela ré às f. 161/162.
O laudo pericial veio aos autos às f. 174/194.
Intimadas as partes acerca da perícia, a ré apresentou manifestação
às f. 201/204 e o autor pugnou pela complementação do laudo produzido, eis que a
perícia não foi realizada sobre o motor da motocicleta (f. 205/26).
Manifestação do perito às f. 211/212 e do autor às f. 216/219.
Às f. 220 foi determinada a realização de perícia complementar na
motocicleta objeto do litígio, intimando-se o perito para promover a completa análise
do motor da motocicleta, bem assim apresentar novos honorários periciais.
Proposta dos honorários periciais às 224/225.
Intimada sobre a proposta, a ré quedou-se silente (f. 227).
A decisão de f. 229 homologou a proposta de honorários oferecida e
determinou a intimação da ré para comprovar o depósito da complementação dos
honorários de perito, sob pena de suportar o ônus de sua desídia (f. 229).
A ré igualmente se manteve inerte (f. 231).
A seguir vieram-me os autos conclusos.
É o relatório. Decido.
No mérito, o feito se encontra apto a receber julgamento, eis que
presente a hipótese do art. 330, inciso I, do Código de Processo Civil, não havendo a
necessidade de produção de outras provas, em audiência ou não.
Trata-se de ação de rescisão contratual c.c indenização por danos
materiais e morais, na qual o autor pretende ver rescindido o contrato de compra e
venda firmado com a ré e condená-la ao pagamento de danos materiais na quantia de
R$ 1.392,01 e de prejuízos morais em valor estimado de R$ 76.000,00.
Diga-se, por premissa, serem aplicáveis as disposições do Código de
Defesa do Consumidor ao contrato celebrado entre as partes, visto que a relação
estabelecida entre elas, indiscutivelmente, afigura-se como relação de consumo, a
teor do que dispõem os art. 2o e 3o do referido códex.
Art. 2o. Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza
produto ou serviço como destinatário final.
Art. 3o. Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada,
nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que
desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção,
transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de
produtos ou prestações de serviços.
Resta evidente então que sobre o contrato celebrado entre as partes
incide as normas consumeristas, já que o liame jurídico existente entre a ré e o autor
visa satisfazer a necessidade deste, como destinatário final (consumidor), por meio da
aquisição de produto comercializado por aquela (fornecedora);
sendo contra legem e despropositada qualquer argumentação contrária.
Desse modo, estabelecida a relação de consumo na presente lide, é
de se aplicar, por consequência, os princípios e diretrizes da Lei Consumerista, como
por exemplo a inversão do ônus probatório, conforme a decisão de f. 138/139.
Trata-se de consequência do princípio da responsabilidade objetiva
dos fabricantes, comerciantes e prestadores de serviços, adotado pela Lei 8078/90.
Contudo, é mister que se esclareça que a regra contida no referido
artigo não é indicativo de que o interesse do consumidor sempre prevalecerá em
juízo, mas apenas é fator indicativo para as partes, de que deverão se desincumbir
dos ônus sob pena de ficarem em desvantagem processual.
Nesse passo, o autor pretende a rescisão do contrato sob o
argumento de que o veículo obtido apresentou sucessivos defeitos desde a sua
retirada, em que pese ele seja zero quilômetro. Paralelamente, a ré afirma que o
veículo adquirido está sujeito a apresentar defeitos, além do que providenciou todos
os reparos na motocicleta quando acionada.
Com efeito, não assiste razão a ré.
Do cotejo probatório constante nos autos, o autor, após adquirir em
23/05/2005 uma motocicleta zero quilômetro da marca Triumph, modelo T1 Tiger 955i,
ano/modelo 2004, com garantia de 02 (dois) anos, foi obrigado a solicitar os serviços
da ré por diversas vezes em exíguo espaço de tempo. Em 18/11/2005 procurou a ré,
não só por ocasião da revisão de dez mil quilômetros, mas por problemas
averiguados no motor, momento em que ocorreu a primeira programação do módulo
de injeção (f. 18, 22 e 82). Ato contínuo, em razão do mesmo problema, novo
atendimento ocorreu em 21/11/2005, ocasião em que houve a segunda programação
do modelo de injeção (f. 83). Posterior a isso, em 02/01/2006, novos reparos
ocorreram no motor do veículo, em virtude do elevado consumo de combustível e da
diminuição do óleo no motor (f. 19, 21, 26 e 84). Em 26/05/2006, novamente foi
constatado o alto consumo de combustível, motivo pelo qual realizou-se uma limpeza
do sistema de injeção (f. 24 e 86). Após isso, em 23/10/2006, na revisão dos vinte mil
quilômetros, constatou-se outra vez o elevado consumo de combustível com
constante liberação de fumaça, realizando a ré novos reparos (f. 25 e 87).
Ora, é incontroverso que o autor se desincumbiu a contento de
demonstrar o fato constitutivo de seu direito, eis que, conforme acima descrito, foi
exaustivamente comprovado que a motocicleta apresentou diversos problemas no
motor que impossibilitaram sua utilização de forma satisfatória e que, não obstante as
diversas tentativas do autor em resolver o reclamo, através da própria ré, não logrou
êxito em seu desiderato, pois, segundo consta, o veículo encontra-se ainda hoje
pendente de reparos que apesar de a ré ter se prontificado a solucionar.
Denota-se os problemas apresentados, não conseguiu resolvê-los, sendo que mesmo que tenha
programado o módulo de injenção mais de uma vez, além da limpeza do sistema de
injeção, o elevado consumo de combustível, assim como a liberação de fumaça pelo
motor, continuaram a existir.
De qualquer forma, em que pese o empenho da ré, cediço é que o
consumidor, ao adquirir um veículo zero quilômetro possui a justa expectativa de que
ele funcione perfeitamente, não sendo razoável que, em pouco mais de um ano, o
bem comercializado pela ré apresente sucessivos problemas, como aconteceu in
casu.
De fato, caberia à ré provar a inexistência do vício, quando da
celebração do negócio, ou culpa exclusiva do consumidor, conforme insculpido no art.
12, § 3o, inc. I, II e III, da Lei do Consumidor, sob pena de responder de forma objetiva
pelos vícios constatados.
Ocorre que assim não fez e tampouco poderia fazer sem a prova
pericial para solucionar o impasse.
Mister ressaltar que foi determinada perícia complementar nos autos
visando sanar a omissão encontrada na perícia realizada às f. 174/194, porque não foi
providenciada a abertura do motor. Contudo, a ré, embora regularmente intimada para
depositar os honorários do perito, negligenciou em recolhê-los (f. 231), de modo que
consabido que a falta de depósito dos honorários do expert implica em renúncia tácita
da prova requerida.
Ademais, mesmo que não se considerasse a desistência da referida
prova, estaria caracterizada a preclusão do direito a sua realização, tendo em vista
que a ré, ante a inversão do ônus probatório imposta na decisão de f. 138/139, não
depositou os honorários do perito no prazo fixado por esta juíza; devendo arcar, pois,
com sua desídia.
Destarte, restou comprovado que, logo após a aquisição do veículo,
este começou a apresentar sucessivos problemas no motor e uma vez comprovada a
negligência da ré, nada obstante as diversas incursões a fim de solucioná-los, a
procedência do pedido inaugural é medida escorreita.
Considerando que os defeitos exibidos na motocicleta adquirida pelo
autor configuram o vício do produto, necessário que seja aplicado art. 18, §1o, inc. II,
do Código Consumerista, o qual dispõe que, não ocorrendo o conserto do produto no
prazo de 30 dias, poderá o consumidor exigir a restituição imediata do valor pago,
corrigido monetariamente, sem prejuízo de eventuais perdas e danos.
No caso dos autos, a quantia a ser restituída é a de R$ 54.400,00
(cinquenta e quatro mil e quatrocentos reais), vez que é esse o montante que o autor
alega ter despendido em razão do contrato, nada obstante não tenha trazido a nota
fiscal, não houve impugnação específica da ré.
Assim, considerando que a responsabilidade objetiva do fornecedor
por vício do produto comercializado, nos moldes dos art. 12 e 13 do Código de Defesa
do Consumidor, cabe perscrutar os danos.
Neste passo, torna-se despiciendo que o consumidor prove a culpa
do fornecedor do produto no inadimplemento a ele imputado. A obrigação do
fornecedor em ressarcir os danos sofridos pelo consumidor aparece como
consequência do nexo causal entre o proceder do agente e o dano resultante. Este é
um ônus que o fornecedor de produtos tem que aceitar para que possa desenvolver
atividades de risco. Logo, a alegação da ré, de que veículo adquirido está sujeito a
apresentar defeitos, além do que providenciou todos os reparos na motocicleta
quando acionada, não elide a responsabilidade que lhe é imputada.
A teoria da responsabilidade civil objetiva prescinde de culpa e possui
como elementos apenas o dano e o nexo de causalidade. O dever de reparar se dá
em relação às atividades desenvolvidas pelo agente. Desta forma, a teoria objetiva
confere certeza à reparação do dano, já que atende ao próprio resultado danoso da
ação. Assim, cabe ao consumidor provar o dano, a utilização do produto ou serviço e
o nexo de causalidade entre ambos para a nascer a obrigação de reparar, tanto pelos
danos materiais como pelos morais eventualmente causados ao autor.
Assim, sendo desnecessária a constatação de culpa, e sendo
incidente, no caso, a responsabilidade objetiva por força do artigo 12 do Código do
Consumidor, o próximo passo é averiguar a ocorrência ou não do dano.
Conforme resulta da doutrina de JOSÉ AGUIAR DIAS 1 , “o conceito de
dano é único, e corresponde a lesão de direito”, sendo que os efeitos do ato ilícito
praticado é que podem ser patrimoniais ou não, acarretando a divisão entre danos
materiais e morais.
É cediço que o dano material é aquele que atinge a vítima no conjunto
das suas relações jurídicas apreciáveis em dinheiro, por isso, o seu ressarcimento
visa à recomposição do patrimônio lesado.
O autor argumenta que suportou prejuízos de ordem material, eis que
teve que se deslocar para a cidade de São Paulo/SP diversas vezes para tentar
solucionar os problemas averiguados no veículo adquirido, contraindo despesas com
hospedagem, combustível, alimentação, pedágio e transporte de guincho.
Contudo, verifica-se que o autor não faz jus ao recebimento do que
despendeu nos dias 18/11/2005 e 23/10/2006, porquanto, consoante atestado nos
autos, mencionadas datas correspondiam, respectivamente, à revisão de dez mil
quilômetros e vinte mil quilômetros da motocicleta adquirida, de modo que o autor, ao
comprar sua moto em outra localidade que não a sua residência, assentiu
conscientemente que as revisões, diga-se de passagem, de interesse do autor, se
dariam naquela cidade, existindo ou não os problemas encontrados.
O restante das despesas, em datas diversas daquelas previstas para
a revisão da motocicleta, deverá ser ressarcido ao autor pela ré, tendo em vista que
ele teve dispêndios ao se deslocar para a capital do estado de São Paulo, visando
solucionar os problemas encontrados no veículo vendido por ela.
Logo, constitui-se do que o autor pagou pelas despesas, excluídos os
dias elencados no parágrafo antecedente, o valor de R$ 974,04 (novecentos e setenta
e quatro reais e quatro centavos).
Por derradeiro, o autor requer a indenização por danos morais,
alegando que os repentinos problemas apresentados pelo bem adquirido, somados à
negligência da ré em resolver o problema, causaram-lhe desgaste de ordem moral
passível de indenização.
No tocante aos danos morais, estes não decorrem automaticamente
do inadimplemento contratual. Isso não quer dizer que os danos morais não possam
existir em decorrência de inadimplemento contratual, mas que eles devem ser
devidamente comprovados, como sucede normalmente nos demais casos.
Pois bem. Os danos morais abrangem o sofrimento ou dor humana
que não se revistam de um caráter de perda pecuniária, mas nasçam de uma lesão a
um direito, que provoque transtornos, aborrecimentos, inconvenientes, enfim, que
alterem o dia a dia da pessoa no cumprimento de suas obrigações corriqueiras.
E, ocorrendo a lesão, tem a indenização a finalidade de compensar o
ofendido no sentido de, senão neutralizar, ao menos aplacar o desconforto imposto ao
consumidor.
Nos dizeres de MARIA HELENA DINIZ 2 :
"A reparação do dano moral é, em regra, pecuniária, ante a impossibilidade
do exercício do jus vindicatae, visto que ele ofenderia os princípios da
coexistência e da paz social. A reparação em dinheiro viria neutralizar os
sentimentos negativos de mágoa, dor, tristeza, angustia, pela
superveniência de sensações positivas, de legria, satisfação, pois
possibilitaria ao ofendido algum prazer, que, em certa medida, poderia
atenuar seu sofrimento. Ter-se-ia, então, uma reparação do dano moral pela
compensação da dor com a alegria. O dinheiro seria tão-somente um
lenitivo que facilitaria a aquisição de tudo aquilo que possa concorrer para
trazer ao lesado uma compensação por seus sofrimentos." DINIZ, Maria Helena.
Curso de Direito Civil Brasileiro, 7o Volume, ed. Saraiva, p. 75.
Portanto, a indenização do dano moral consiste na reparação
pecuniária prestada pelo ofensor, de desfalcando seu patrimônio
em proveito do ofendido, como uma satisfação pela dor que lhe foi causada injustamente.
Dentro, pois, da miríade de causas possíveis para o dano moral, é
indiscutível que as situações experimentadas pelo autor (privação do bem, tendo que
submeter-se por diversas vezes à concessionária e utilizar-se de outros meios de
transporte não convenientes, bem como o fato de ter que interromper sua rotina
reiteradamente face os problemas apresentados), sem dúvida utrapassam as raias do
aborrecimento inerente ao cotidiano, sendo certo que tal fato lançou reflexos
negativos na esfera de sua personalidade, retirando-lhe a paz, a tranquilidade de
espírito, a dignidade, causando-lhe sofrimento, tristeza, angústia, humilhação e
desequilíbrio em seu bem estar.
De fato, não é necessário grande esforço para perceber a dimensão
do abalo na esfera anímica e psíquica do autor, as quais, por se passarem no interior
do indivíduo, independem de prova, pois se presumem ipsu factum. Significa dizer
que o prejuízo moral nos casos desse jaez derivam naturalmente do próprio fato
ofensivo.
É assente, aquele que adquire um veículo zero quilometro, por óbvio,
tem a expectativa de durabilidade, não cogitando de aborrecimentos e inconvenientes
quando de sua utilização, tanto mais que tais inconvenientes começaram quando a
moto possuía tão somente alguns meses de uso, exigindo diversas tentativas de
reparo, sem que houvesse efetiva solução do problema.
No caso dos autos, ainda que se diga que algum problema ocorrido
com a motocicleta seja tolerável, foi totalmente extrapolada qualquer razoabilidade já
que durante quase dois anos inteiros, o consumidor teve que procurar reiteradas
vezes a assistência técnica. Mais do que isso, os problemas já iniciaram nos primeiros
meses após a aquisição da motocicleta. Então, o que razoavelmente poderia ser
tolerado, aqui foi ultrapassado em muito.
O parâmetro adequado para mensuração da indenização por danos
morais deve ter em vista a condição sócio-econômica dos envolvidos, a intensidade
da ofensa e sua repercussão.
Sopesadas estas constatações, aliadas àquelas próprias do caso sob
judice, tenho que a fixação de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) atende ao caso concreto,
sempre tendo em mira que a estimativa do dano moral não se destina à reposição do
bem lesado, mas sim à compensação pelo abalo emocional, ao desgosto acarretado
pelos sofrimentos decorrentes do vício apresentado no veículo, bem como da
inescusável negligência no pronto reparo.
Ante o exposto e pelo o mais que dos autos consta, resolvo o mérito
da ação nos termos do art. 269, inc. I, do Código de Processo Civil, para o fim de
declarar rescindido o contrato celebrado pelas partes, com a restituição do veículo à
ré e a devolução dos valores pagos pelo autor no valor de R$ 54.400,00 (cinquenta e
quatro mil e quatrocentos reais), corrigidos a partir do efetivo desembolso e juros de
mora a contar da citação. Outrossim, condeno a ré a pagar indenização por danos
emergentes ao autor, no valor de R$ 974,04 (novecentos e setenta e quatro reais e
quatro centavos), corrigidos a partir do efetivo desembolso e com juros de mora
contados da citação, bem como danos morais na ordem de R$ 5.000,00 (cinco mil
reais), corrigidos a partir da presente sentença e com juros de mora contados da
citação. Em face da sucumbência, condeno a ré ao pagamento das custas
processuais e dos honorários advocatícios, que arbitro em 10% (dez por cento) do
valor da condenação, nos termos do art. 20 do Código de Processo Civil.
Certificado o trânsito em julgado, arquivem-se os autos, com
observância das formalidades legais.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se.
Campo Grande, 07 de maio de 2015.
Gabriela Müller Junqueira
Juíza de Direito
Modelo 1049582 - Endereço: Rua da Paz, no 14, Jardim dos Estados - 3o andar - Bloco I - CEP 79002-919, Fone: 3317-3381,
Campo Grande-MS - E-mail: cgr-7vciv@tjms.jus.br - autos 0116193-47.2007.8.12.0001